O dia 20/02/2002 é uma data marcante na história da luta pelos direitos das pessoas com Fibrose Cística no Estado de São Paulo. Embora tenha sido esquecida por muitos, relembrá-la é essencial para reconhecer as conquistas e valorizar o acesso mais facilitado aos medicamentos nos dias de hoje.
É fundamental lembrar que pessoas e associações se uniram e lutaram incansavelmente pelo bem de todos. Também é necessário valorizar e fortalecer essas associações, que sempre estiveram na linha de frente e continuam trabalhando para garantir a regularidade e a qualidade dos medicamentos e do tratamento da Fibrose Cística em nosso estado.
O ato:
Na manhã do dia 20 de fevereiro de 2002, ocorreu a maior manifestação popular pelos direitos das pessoas com Fibrose Cística no Brasil. Entre 400 e 500 manifestantes, incluindo pessoas com FC, familiares e apoiadores, reuniram-se em frente à Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo (SES), na capital paulista.
Convocados pelas associações representantes dos pacientes : APAM (Capital), FibroCis (Campinas) e GAFFIC (Ribeirão Preto), e liderados pela ABRAM, os manifestantes portavam faixas de protesto e vestiam camisetas com mensagens pedindo “Justiça” e “Socorro aos pacientes com Fibrose Cística”. Embalados por gritos de protesto, concentraram-se na entrada da SES/SP e em seus arredores.
A maior conquista da causa Fibrose Cística no Estado de São Paulo.
Uma comissão representando as famílias e associações, liderada pelo presidente da ABRAM, Sr. Sérgio Sampaio, acompanhada por representantes do Ministério Público Estadual e pelo deputado estadual Roberto Morais, foi recebida pela Secretaria Estadual de Saúde.
Após horas de debates e negociações, chegou-se a um acordo para a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), garantindo que o Governo do Estado, por meio da SES/SP, cumprisse o protocolo de fornecimento dos medicamentos necessários para o tratamento da Fibrose Cística.
Até o ano de 2002, o único medicamento disponibilizado para o tratamento da Fibrose Cística eram as enzimas pancreáticas, oferecidas em uma única concentração (8.000 UI de Lipase).
Em Campinas, graças a uma ação da FibroCis, também era disponibilizado o Dornase Alfa (Pulmozyme).
"Era muito difícil o tratamento, conseguíamos um ou outro medicamento graças à doação da empresa em que meu marido trabalhava na época."
Aparecida Serafim Polastre, mãe de dois jovens com FC.
"Só pegávamos as enzimas na época, os outros eu comprava: Gentamicina, Azitromicina, TCM, Ibuprofeno, Soro fisiológico e até o suplemento alimentar. Era um tratamento escasso e não como hoje."
Ana Paula Colla , mãe de um jovem com FC.
"O acesso aos medicamentos era bem complicado. Antes até era necessário fazer importação individual das enzimas."
Ângela Maria Natali Ferrinho, mãe de uma jovem com FC.
Cronologia
1º - No ano 2000, a ABRAM (Associação Brasileira de Assistência a Mucoviscidose) lidera a luta por medicamentos no Estado de São Paulo, apoiada pelas associações APAM, FibroCis e GAFFIC, mobilizando pacientes, pais e cuidadores com o intuito de pleitear, junto à SES/SP, os medicamentos necessários para o tratamento das pessoas com Fibrose Cística.
2º- De 2000 até o início de 2002, a ABRAM se reúne periodicamente com médicos especialistas e elabora um Protocolo de Medicamentos (aproximadamente 40 itens).
3º- A ABRAM, o MPE (Ministério Público Estadual) e familiares de pacientes movem uma Ação Civil Pública contra o Governo do Estado de São Paulo para garantir a implementação do Protocolo de Medicamentos.
4º- Em 20 de fevereiro de 2002, o "Dia D": Manifestantes, pessoas com Fibrose Cística, familiares e apoiadores se concentram em frente à SES/SP, demonstrando força e união das famílias e associações. O Estado assina o TAC, e a SES/SP passa a cumprir o protocolo de medicamentos.
5º- Em 4 de novembro do mesmo ano, foi publicada a Lei Estadual 11.250, de autoria do deputado estadual Roberto Morais, que dispõe sobre o fornecimento de medicamentos adequados ao tratamento da Fibrose Cística e dá outras providências, ratificando essa conquista.
Depoimentos:
"Esse movimento mudou a vida de centenas de pessoas no estado de São Paulo e nos deu forças para buscarmos novas conquistas como o Teste do Pezinho."
Sérgio Sampaio
Presidente da ABRAM
"No Estado de Estado de São Paulo, comemoramos 23 anos de fornecimento gratuito dos medicamentos e suplementos alimentares à todos pacientes diagnosticados com FC e 15 anos de triagem neonatal (teste do pezinho) com pesquisa para FC em todos os recém nascidos. Até hoje foram as duas maiores conquistas da FC no nosso estado, consequentemente melhorando a qualidade e aumentando expectativa de vida dos pacientes."
Marco Antônio de Paula
Ex-Presidente da APAM
"Ao longo dos meus mandatos como deputado estadual, muitas foram as lutas e vitórias. Mas sem dúvida alguma, as que mais me marcaram foram as lutas em defesa do inalienável direito à vida. Nesse contexto, vencer desafios ao lado dos familiares e portadores de Fibrose Cística foi o mais gratificante dos bons combates que enfrentamos juntos."
Roberto Morais
Ex-Deputado Estadual (autor da Lei 11250)
"A partir deste movimento, iniciou-se um calendário de reuniões semanais na Secretaria de Saúde com representantes da APAM, ABRAM, FIBROCIS, GAFFIC e do Gabinete do Deputado Roberto Morais, onde se acordava o fornecimento dos medicamentos solicitados e suplementos nutricionais de forma escalonada. Tive a honra de representar por muitas vezes a Fibrocis."
Célia Regina Steter Linhares (in memoriam)
Secretaria Executiva da FibroCis
de 1997 a 2016
"Tive a honra de ter participado ativamente das nossas duas maiores conquistas: dos medicamentos, de 2000 à 2002 e o teste do pezinho que foi concluído em 2010. Na época não tínhamos as facilidades de comunicação que temos hoje, reuníamos com frequência na capital para discutir e preparar os atos. Era tudo muito difícil, mas havia união, as famílias apoiavam as associações e era prazeroso. As dificuldades abrilhantaram ainda mais nossas conquistas."
Claudenor Abilla
Presidente da FibroCis
"Nos últimos 23 anos tivemos uma maior divulgação sobre a Fibrose Cística entre os profissionais da saúde, pacientes e familiares. Houve também um maior comprometimento do poder público com a atenção aos pacientes com a doença. E após a implantação da Triagem neonatal no estado, contemplando a triagem para a Fibrose Cística, tivemos diagnósticos mais precoces e a possibilidade de uma assistência melhor estruturada."
Dr. Antônio Fernando Ribeiro
Ex-Coordenador do CERFC -Unicamp
MATÉRIA ESPECIAL FC
Dia "D", o dia que mudou a história da Fibrose Cística no Estado de São Paulo.
(matéria atualizada em 17/02/2025)
Colaboração:
ABRAM - Associação Brasileira de Assistência à Mucoviscidose
APAM - Associação Paulista de Assistência à Mucoviscidose
Célia Regina Steter Linhares (in memoriam)
Marco Antônio de Paula
Acervo FibroCis
Redação e Edição:
Claudenor Abilla
Revisão:
Aline Gonçalves
Ana Lúcia Chiari Bertozzo
Marco Antônio de Paula